Colégio dos magos caldeus
CABALA CRISTÃ
Sistematização do estudo da kabballa sob a ótica cristã
A Kabballa, em termos absolutos, não se confunde com o judaísmo e suas origens são mais antigas (Babilônia e, possivelmente, Suméria, historicamente abordando). Os judeus fizeram uma bela releitura, adaptada parcialmente ao seu entendimento. Um fato notório, que os diferenciam, é que não há o Deus “escondido”, “oculto” para o judeu religioso (não estudante de Kabballa): IHVH é bem “aparício”. Em geral, os judeus dão duas origens à Kabballa: revelação a Abraão ou a Moisés.
De qualquer forma, devemos aos judeus kabballistas, indubitavelmente, o mérito de trazer este grande conhecimento, em sua essência, até nós. Em respeito a isso, grafamos nosso estudo de forma ligeiramente diferenciada. Assim como a Kabballa judaica não é judaísmo, a cabala cristã não é cristianismo (é a parte esotérica e mística que pode extrapolar e explicar a doutrina cristã). Não se consegue justificar a Kabballa judaica pela crença dos hebreus religiosos, pelo pentateuco somente, tão pouco se o faz em relação aos cristãos, sua versão da cabala e a tentativa de a justificar integramente pelo Novo Testamento.
Faz sentido falar em cabala cristã? Bom, a pedra angular do (inicial “pequeno”) racha no judaísmo que gerou o cristianismo foi a aceitação, por parte de alguns, de que Jesus de Nazaré era o esperado Messias e que este era a encarnação do Verbo de Deus, o qual liga o Criador Incriado a criatura humana. Assim, só faz sentido se a kabballa contiver em seus ensinamentos a citação da espera de um Messias. Felizmente, no Zohar, isto é explícito.
O cristão deve lembrar, por exemplo, da passagem que Jesus declara (Mt 19:8-9): “Ele disse: ‘Moisés, por causa da dureza dos vossos corações, vos permitiu repudiar vossas mulheres, mas desde o princípio não era assim. E eu vos digo que todo aquele que repudiar a sua mulher – exceto por motivo de fornicação – e desposar uma outra, comete adultério.” Verifica-se aqui que Jesus remete a uma tradição, que lhe é conhecida, anterior a Moisés, a qual, pelas palavras do mestre (princípio), é a que origina qualquer outra vertente. Jesus, portanto, vêm reavivar tal tradição. Isso traz reflexo em vários estudos, inclusive na cabala.
A interpretação da kabballah deve ser descartada então? Não, mas revista à luz dos ensinamentos do messias, Jesus.
O título de primeiro cabalista cristão se atribui ao apóstolo Paulo, pois ele foi ensinado por Gamaliel, que era neto de Hilel, o qual fundou uma conhecida escola de Kabballa. É possível perceber traços destes ensinamentos em alguns trechos do Evangelho. Por exemplo, em At 17: 23: “Pois, percorrendo a vossa cidade e observando os vossos monumentos sagrados, encontrei até um altar com a inscrição: ‘Ao Deus desconhecido’. Ora bem, o que adorais sem conhecer, isto venho eu anunciar-vos”. O apóstolo de maneira clara, mais sutil, mostra que domina a noção da existência de um Deus desconhecido (que não é de domínio do judeu religioso comum).
No cristianismo, o Deus desconhecido é a trindade: Pai, Filho e Espírito Santo. Paulo foi Os anunciar. Hoje, para Os conhecer, o mais indicado é a leitura do Novo Testamento.
João, o apóstolo, pelo teor místico e simbólico de suas obras no Novo Testamente, é indiscutivelmente um grande cabalista cristão. Embora, por berço e ligação ao estudo formal desta verdade, tenha atribuído a Paulo o título de primeiro cabalista, é em João, particularmente no seu evangelho, que apoiaremos grande parte dos argumentos aqui desenvolvidos.
É possível, ainda, verificar estudos, obras literárias, da cabala cristã desde o renascimento (o Papa Sisto IV figura como um grande incentivador neste aspecto). Dentre os ocultistas mais famosos, Eliphas Levi é o que mais contribui para a formulação aqui apresentada. Faço das seguintes palavras dele as minhas: “As poucas páginas que se seguem são simples apanhados das hipóteses cabalísticas; são externas à fé e as indicamos somente como pesquisas curiosas. Não nos cabe inovar em matéria de dogma, e nossas asserções como iniciado estão inteiramente subordinadas à nossa submissão como cristão.”
Por tudo isso, dou-me a liberdade de crer, baseado no cristianismo e na cabala, que há perfeita compatibilidade entre ambos, motivo pelo qual denomino esta vertente de estudo de cabala cristã, não meramente um estudo de cabala feito por um cristão (como me defino).
Extrato do livro "Cabala Cristã", de Leonardo Oliveira de Araújo e Marlanfe Tavares de Oliveira.